O meu primeiro Alfa - Um carro com história

Corria o ano de 1975 quando deixei a Escola Industrial para começar a vida profissional, inicialmente na João ferreira dos Santos na oficina Grundig, mais tarde na Conrad na secção de telecomunicações Racal e Storno, sem antes ter passado pelo Laboratório de Electrónica da Faculdade de Engenharia Eletrotécnica como tarefeiro.

Conheci o Sr. Canhoto, chefe das oficinas NCR da Mecanodex por intermédio do Barbosa que lá trabalhava, meu colega da Escola Industrial, numa das muitas saídas da cidade para as praias do sul.

Fiquei a saber que ele tinha um Alfa para venda, baratinho, que estava parado já há uns bons dois anos, a precisar de uma revisão mecânica aprofundada já que o motor deveria estar "colado".

O meu primeiro vencimento foi para pagar ao Canhoto o Alfa Romeo 1600 TI Super de 110 alegados cavalitos, em bela cor amarela com hard top preto.

Cravei o Lopes para me rebocar o carro para a garagem da vivenda do Barbosa, onde funcionava a Pensão Aristocrata, propriedade de sua mãe, Dna. Maria.

A ideia era restaurarmos o motor, aprendendo mecânica no processo, já que a nossa área era eletrotecnia, e com a ajuda de um hóspede que era mecânico especialista da Renault.

Desmontar motor e caixa de velocidades foi relativamente fácil, abrir o motor também, agora identificar os problemas já foi mais complicado.

Aparentemente tudo estava bem, nada parecia danificado, a cambota e capas estavam intactas, as camisas, pistões e segmentos também pareciam isentos de danos, a corrente de distribuição, distribuidor, bomba de água, bomba de óleo, enfim, tudo parecia bem.

Contudo a cabeça com as suas duas árvores de cams, as 8 válvulas e pastilhas, tinha a junta de cabeça "queimada" e mais grave, já tinha sido retificada no torneiro pelo menos uma vez, e duvida-se se seria possível retifica-la uma vez mais.

Dada a escassez de peças que se fazia sentir na época, e considerando que uma cabeça completa custaria uma avultada despesa num motor cujo bloco de alumínio já mostrava sinais evidentes de desgaste nas sedes de parafusos excessivamente apertados provavelmente sem terem visto sequer uma chave dinamómetro, implicando ainda mais uma despesa a abrir novas roscas e mais alterações, optou-se pela ida ao sucateiro.

O sucateiro, lá para os lados do aeroporto, ouviu o meu pedido sem prestar grande atenção. Eu queria um motor em bom estado de um salvado Alfa Romeo. Disse-me para passar lá dentro de duas semanas.

Acabei por ter que passar umas boas vezes, sem sucesso, até que um dia ele telefonou ao Arnaldo, meu amigo e funcionário da Volvo Penta acessórios, a dizer que a encomenda estava disponível para levantamento.

Depois de seis meses com o carro parado na garagem do Barbosa, finalmente pudemos montar um motor usado, em bom estado, que apenas necessitou de uma ida à Alfa Romeu na baixa para ajustarem as válvulas com as famosas pastilhas.

Entrou a falhar e sem ralenti, saiu pela minha mão com o trabalhar regular e o som entusiasmante do escape, convidando a umas aceleradelas de teste.

Foi meu companheiro cerca de três anos, até o ter doado ao Barbosa e Arnaldo. O carro deu entrada na oficina do Dionísio e Zeca "Maluco" lá na Rua do Trabalho, para ser restaurado na chapa e pintado de vermelho, longe de imaginar que esta seria a sua cor original.

Vim a saber muitos anos depois, na era do Facebook, onde publiquei umas fotos do carro, que este tinha sido comprado pelo Walter Gameiro ao Alex Correia da Fiat/Alfa Romeo, originalmente em cor vermelha, e devidamente modificado com escape de rendimento, cabeça rebaixada, carburadores duplos weber e por aí adiante, com suspensões adequadas ao objetivo da compra, que foi competir nos rallies.

Nota: Em 1975 vivia-se o tempo da mudança na África Portuguesa, e este relato teve lugar em LM (Maputo depois de 1976), Moçambique.

Circa 1975 76, eu e o Zé Maria, apanhados pela objectiva do Barbosa ao lado do Giulia TI.